quarta-feira, 28 de julho de 2010

O pardal

Era mais uma manhã sombria de inverno. Na praia, apenas algumas poucas pessoas que necessitavam de espaço fora da vida barulhenta do bairro, como os três amigos que se sentaram apenas para admirar o vai e vem da maré e a paisagem cinza bucólica, e a menina que passeia sozinha dividindo pensamentos com os pombos que mariscam na vazante. Olhando mais ao longe pode-se ver vários cães vadios atrás de uma única cadela descontrolada. Os pensamentos iam e vianham e a mente flutuava leve sob o céu plúmbeo. Nada no ar, na terra, ou no céu poderia causar mais espanto do que aquele pássaro ordinário rodeando as flores, atrás de algum inseto obviamente, como um verdadeiro beija-flor pairando no ar e observando a vítima.
Nunca tinha observado um pardal pairando. Havia tanta beleza, ainda que com pouca graça, e uma leveza desajeitada que fez com que meu espírito também quisesse compartilhar aquele desvio de personalidade, ser outro ser por uns momentos apenas para não compartilhar da podridão da minha própria espécie vil.
Era um danado aquele pardal. Muito esperto. Assim como as pessoas na praia, ele também buscava um momento de liberdade. Assim como muitos em vários lugares fingindo ser o que não são, ora para impressionar alguém, ora para não encarar a si mesmo, mas com toda a certeza insatisfeito com o rumo natural das coisas, pois assim como na lei de Murphy, a sorte tende a falhar quando não se está atento a percebê-la. 
Eu tive a sorte de admirar aquele vôo curto, talvez voltando lá todos os dias jamais consiga observar aquilo novamente. Talvez já tenha visto antes e nem tenha dado importância. Agora eu consigo perceber várias coisas que passavam batidas. Agradeço àquele pardal.

sexta-feira, 23 de julho de 2010

Lixão

Eu estive no lixão e vi um futebol horrendo, com pequenos momentos de magia.
Quase valeu pelo ingresso.
Meu time perdeu.

terça-feira, 20 de julho de 2010

Chuva e rock'n'roll

Apesar de toda minha ojeriza ao sol, a chuva ainda consegue me irritar mais. É foda quando você quer sair, precisa sair, ou está só na rua de bobeira e começa a chover. Quando eu era guri nem me importava com chuva, na verdade eu gostava bastante de andar sob ela. Adorava estar molhado. Não saía com carteira, celular, nada. Era apenas eu e mais uns pedaços de tecido me cobrindo, alguma companhia, ou nenhuma e a alegria de estar sendo encharcado pela água do céu. Agora velho eu fico muito pra baixo quando chove. Só penso em encher a cara de conhaque, e ouvir, e tocar alguma música doentia, preferencialmente rock'nroll.
Acho que o inverno deixa as pessoas mais emotivas e por isso o lado melancólico dos solitários fica à flor da pele.
Tenho quase certeza que grande parte das melhores canções do rock ou blues foram feitas sob um tempoal deprimente de inverno enquanto um poeta solitário, ou acompanhado de infelizes, deixa pairar no ar alguma idéia que o inquieta o espírito. Essas idéias ficam eternizadas nas mentes de várias pessoas em momentos de sol, sereno, chuva etc. Mas é só quando chove que as palavras encharcadas adquirem o seu real peso.
Por aqui a chuva só me estressa: não inspira-me nenhuma grande frase, não me sopra nenhuma grande idéia, não me anima a fazer mais nada além de comer água e tentar arrumar uma boa companhia. Infelizmente até as boas companhias odeiam sair nos dias chuva.

segunda-feira, 5 de julho de 2010

A vida é curta e pode ser ruim

Algumas pessoas conseguem basear suas alegrias na quantidade de desgraçados que conseguem colocar na pior. Entre os prazeres provenientes da mesquinhez que habitam o espírito humano essas pessoas escolhem o dolo como seu favorito. Se é que uma coisa nociva à dignidade humana pode ser considerada um prazer. E o que é dignidade num mundo com esse tipo de gente? É inocência pensar que as pessoas não sintam prazer em fazer o mal. Melhor é provocar, admirar, pesar, ou lamentar a desgraça alheia do que a própria desgraça, porque é tudo do que entendem.
Por que será que algumas pessoas preferem esse tipo de vida a uma onde se pode confiar uns nos outros? Por que as pessoas não conseguem se respeitar mutuamente?
Por que é tão difícil ser cordial?

sábado, 3 de julho de 2010

Bem que minha mãe dizia

Ontem eu tive uma grande decepção com a seleção canarinho. Incrivelmente uma partida que não se esperava nenhuma surpresa se transformou numa nova lição de vida para muitos brasileiros incluindo este que vos escreve.
Passei a semana toda tentando articular um lugar legal para assistir a partida entre Brasil e Holanda certo de que seria um grande jogo e mais uma vez o Brasil ia espancar, mas os dias foram passando e apenas na véspera foi que eu tive alguma luz de algum lugar para assistir. O palno era ir de bike, dormir na casa de alguém e no dia seguinte me dirigir ao "bar do jogo". O lance é que São Pedro não estava querendo cooperar com minha rotina ciclística e mandou chuva pra valer. Acabei saindo com a bike no rack na esperança de que pros lados de lá pudesse andar mais tranquilamente pelas ruas molhadas, porém não alagadas como as da suburbana. Eu tinha tudo o que precisava e o mais importante, a caminha 10, suja, estava guardada em minha pochete só esperando a hora  de se mostrar e dar a mesma sorte que deu na última partida.
Eu dei um rolezinho na night com meu brother Maluquinho e mais um brother que viera de Sampa curtir a SalCity. Tomamos todas e eu fui pra casa de uma amiga passar a noite e aguardar o 2 de Julho, aniversário de independência do Brasil, mas que nós brasileiros insistimos em dizer "Independência da Baiha", como se a Bahia fosse independente de alguma porra. Chegando lá bebi mais um pouco de conhaque, amarula e cachaça, porque vocês sabem que eu sou um profissional que jamais diz não a uma bebidinha no fim de noite.
Acordei com a enxaqueca, velha parceira, latejando seu mau humor, como para me avisar que eu deveria ter ficado na cama, mas eu estava ansioso demais pra dar atenção a ela e fui cuidando de olhar o tempo, ligar pros camaradas e me preparar pra cair no mundo, mas um mundo de água caía em cima da cidade e meus planos de ir de bike assistir ao jogo foram indo por água abaixo.
A manhã avançou, chegou a hora do jogo e nós decidimos assistir em casa mesmo. A tv nem queria exibir as imagens, tudo parecendo querer me fazer desistir de assistir, mas eu sou brasileiro, né? Demos um jeito na antena e nem quando eu vi o Brasil de azul e lembrei de pegar minha camisa amarela que estava dobrada pelo avesso, dentro de um saco, dentro da pochete. Assisti ao jogo muito confiante na seleção, nem mesmo a virada dos holandeses abalou minha fé, mas o apito final me mostrou que nem só de fé vive o homem e foi aí que eu me toquei de que não estava com meu amuleto de sorte, e o que é pior, esqueci das sábias palavras de minha mãe quando eu ainda estava aprendendo a cuidar de minha própria roupa: "Não guarde roupa pelo avesso que dá azar."

Se chegue

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