A suburbana estava tranqüila. Tem alguns pontos sagrados de parada para reabastecimento, mas infelizmente os bares estavam fechados. Vim todo o caminho a bico seco, porque um homem bruto como eu não ia ficar bebendo água de estômago vazio. Fui parar apenas na feira de São Joaquim, onde comprei umas frutas para meu desjejum.
Fui para o ferry-boat na esperança de ainda encontrar o pessoal da pedalada, mas não vi ninguém. Eu tinha esquecido de olhar minha carteira e só lá que eu descobri que tinha apenas 17 reais e a passagem para a bicicleta custava R$ 13,45. Por sorte aceitava cartão e eu adiantei meu lado. Peguei o ferry de 7:40.
Lavei as frutas no banheiro do ferry e fiquei me refestelando enquanto curtia a vista. O porto de Salvador estava congestionado, havia navio pra caramba aguardando para atracar, grandes, enormes, gigantescos. Ao longe a gente vê a ponta de Humaitá e a medida que o barco se afasta a gente pode ver a quase toda a cidade, até mesmo a igreja de Periperi. Gastei 10 reais com um óculos escuro, porque o que eu estava usando, arranhado, incomodava muito e fiquei apenas com 7 contos na carteira.
Chegando na Ilha, fui direto no Bompreço pra saber até que horas ficaria aberto, caso eu precisasse comprar algo no cartão para não morrer. – Tá aberto até 19h. – Disse a gracinha que empacotava as compras. Segui meu caminho pela estrada Bom Despacho-Nazaré sem saber ao certo que caminho seguir entrei em Vera Cruz, que eu não conhecia e antes de chegar na praia encontrei um grupo imenso de bikers vindo em sentido contrário. Era o pessoal com quem eu ia pedalar junto com um outro grupo de ciclismo do centro da cidade. Dei meia volta e segui a galera. Pelo menos não estava mais sozinho.
O povo não tinha muita certeza do “por onde ir” e isso causou um certo impasse em algum lugar que parecia ligar o nada ao lugar nenhum, mas chegamos a um acordo e descemos por uma trilha verdadeiramente bonita e desafiadora. Pra começar era meio areia e meio barro, como o meu pneu não era liso eu não tive muitos problemas, mas tinha uma barreira em minha frente, ora deslizando, ora atrasando meu lado, então eu resolvi ir para o pelotão da frente. O problema foi que numa pequena descida, já chegando na base, minha roda dianteira afundou na areia e eu fui arremessado para a frente. Ainda tentei abrir as pernas e pular o guidão, mas meu shorts ficara preso e eu caí com tudo quase perdendo o saco só tendo tempo de virar de costas para o chão, jogando também a bike pra cima evitando que ela terminasse por cair em minhas costas. Por sorte pegou apenas na coxa e a bike teve apenas a manete esquerda quebrada, mesmo assim ainda conseguia frear com o cotoco.
De Amoreiras seguimos não sei pra onde, mas muito mais adiante disseram que era pra um lugar chamado Baiacu”-Y” que estávamos seguindo, ou Baiaquíves, para os mais íntimos. Nesse percurso alguns ciclistas tiveram problemas com suas bikes e em uma das muitas paradas, só depois de algum tempo parados é que fomos saber que estávamos em frente a um posto médico, e eu logicamente me lembrei que havia bebebouro e dei a idéia pra quem estivesse “seco”, como eu, ir encher suas garrafinhas lá. Foi um maluco na minha frente, encheu sua garrafa e vazou, eu fui logo em seguida, em chi minhas duas garrafinhas e vazei, mas quando eu saí do posto não encontrei nenhuma alma ciclística na pista esperando, ou mesmo pedalando por perto. A galera simplesmente desapareceu e lá fui eu atrás do bando.
Devo ter pedalado uns 5km até ver sinal das pessoas e isso já me deixou meio puto. Tava começando a pensar seriamente em continuar minha jornada sozinho (ia ser bem mais divertido). Quando finalmente alcancei algum grupo (que aguardava alguém com o pneu furado) marcamos de nos reunirmos no posto, mas quando cheguei lá o infeliz estava fechado então paramos numa “venda” para reabastecer. Pedi logo uma cerveja e lá se foi mais 2,5 dos meus 7 reais. O bom foi que como o pessoal de Periperi não chegou, eu bebi no gargalo, sozinho e aquilo me meu tanto fôlego que voltaria pra casa numa jornada só. Alguns ciclistas também eram adeptos da cerveja, mas como eu não conhecia e nem fui apresentado a ninguém, me limitei a fazer um brinde discreto. A garota que atendia nessa “venda” era uma gracinha então eu puxei conversa sobre a trilha que seguia ao lado do estabelecimento. Ela disse que ia dar num rio com cachoeira e tudo e que seriam uns 40 minutos ou menos de bike. Falei com alguns ciclistas e eles até acharam uma boa, mas quando consultaram a chefe ela foi categórica: “Não vou porque eu não conheço. A gente vai seguir o que tava previsto!” e isso deu o assunto por encerrado, mas eu ainda volto lá.
Depois muita admiração, de várias fotos, descanso etc voltamos em direção à Barra do Gil e Mar Grande para nossa jornada final. Gastei mais 50 centavos com tangerinas e agora minha grana era apenas para emergências. Em Barra do Gil eu saí pedalando pela areia dura da maré baixa, de saque nas gracinhas que desfilavam pela praia, numa sensação total de liberdade e desapego. Passamos pelas ruínas de mais alguma coisa do Império, acho que um engenho, ou sei lá o que e, depois de esperar o conserto de mais uma bike quebrada, chegamos finalmente em Mar Grande para o almoço e a volta pra casa.
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